Arquitetura de alienação e as repercussões no corpo
- Estela Turozi.

- 3 de dez. de 2019
- 2 min de leitura
O meio ambiente contemporâneo e a arquitetura standard desempenham um papel opressivo. Trabalhando o dia e o ano inteiro à luz artificial, não podemos contar com a rotação do sol que confere pontos de referência temporais. Além disso, já que a luz não circula e muito menos a sombra, o corpo não é mais modelado pelo contínuo e natural jogo de claro-escuro. Nosso relevo, terceira dimensão e referencia no espaço são achatados, reduzidos. A luz artificial e sempre idêntica apaga-nos, esmaga-nos. Rouba-nos ainda outra prova da existência: nossa sombra. Quanto ao movimento natural do corpo em direção ao sol, é suprimido. Com o tropismo atrofiado, perdemos uma parte do ¨natural¨, da vida vegetal e animal.

luz da cidade
Atravessar um vasto hall onde todos os objetos nos ultrapassam em tamanho, faz com que nos sintamos diminuídos e com a confiança abalada. Como esse espaço com a finalidade de acelerar o movimento da multidão, a pessoa sozinha não se sente bem nele; vê-se obrigada a modificar o próprio ritmo nesse espaço estruturado como local de passagem que desemboca numa escada ou num elevador.
A exigência de rentabilidade dos prédios modernos faz com que as escadas se situem na coluna central do edifício. Ao subir, não temos, pois, nenhuma vista do exterior, nenhum jeito de nos situarmos no espaço. Ficamos literalmente desnorteados. Sem norte nem sul.
Se a escada é circular, os degraus com tamanho e distância regulares, nosso olhar, avançando, não sabe nos informar se estamos chegando aos últimos degraus. É quase inevitável que tateemos com o pé ou que tropecemos antes de chegar ao patamar. E essa incerteza ou falta de jeito condicionam negativamente nosso comportamento durante a entrevista que tivermos.
Os elevadores perturbam nossos pontos de referência espaciais, assim como, por causa da irritação da parede vestibular, alteram a percepção que temos do peso do corpo e da relação entre cabeça e corpo. As impressões são complexas; mas resumindo, ao começar a subida, as pernas parecem mais pesadas. No momento da parada temos a impressão de que o corpo continua a subir antes de descer. A impressão de leveza no momento da parada é seguida da impressão de que o corpo esticou, como se a substancia pesada interna se soltasse dos pés e quisesse sair pelo alto. Na descida, o corpo parece não só mais leve como mais comprido, como se a parte da cabeça não acompanhasse o movimento e ficasse no mesmo lugar. O essencial é que, no elevador, nossa unidade corporal é atacada e sofremos por isso um efeito psíquico desfavorável.

elevador
Locais alienadores, talvez concebidos no quadro de uma política de intimidação, não deixam de ser onde temos que viver. E, apesar de tudo, queremos viver plenamente. A solução não consistirá em considerar o corpo como lugar primeiro e primordial de nossa vida? Morar antes de mais nada no próprio corpo, saber organizar lhe os movimentos, do interior, confere-nos ao menos a possibilidade de nos libertarmos da intimidação dos espaços organizados para fins sociais. Sentir-se bem no próprio corpo não será, sobretudo, poder sentir-se, admitir, perceber e desenvolver as próprias sensações?
Texto extraido do livro: O corpo tem suas razões – Antiginástica e consciência de si. Thérése Bertherat, Carol Bernstein.









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