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O Desfralde e a Crise da Vontade: Resgatando o Self Verdadeiro na Jornada de Autonomia

  • Foto do escritor: Estela Turozi.
    Estela Turozi.
  • 24 de nov.
  • 3 min de leitura
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Ultimamente, tenho vivido o desafio do desfralde com minha filha de 3 anos. Neste último feriado prolongado, fiz uma nova tentativa de introduzir a calcinha, mas os sinais foram claros: ela ainda não está madura emocionalmente para essa transição. Ela ficou bem brava algumas vezes, negou-se a falar sobre o assunto, e o principal, ainda quer manter o controle absoluto do próprio cocô e da segurança da fralda.


Minha escolha, como mãe e psicanalista, foi simples: não vou treiná-la.

É nesse ponto que o olhar do mundo se esvazia. É perceptível que as pessoas não entendem o que estou falando, pois, para a sociedade, tudo se ensina, tudo se treina. A crença é que o corpo da criança é território de treinamento, e a emoção é apenas um "capricho" a ser corrigido com insistência e muita explicação, o tal "pulso firme."


Mas, como nos lembra Rudolf Steiner, "Toda educação é autoeducação." O desfralde, portanto, deveria ser uma conquista interna, nascida da vontade dela.


O treinamento, sim, funciona. A criança sai da fralda. No entanto, ele nos impõe custos que pagamos por toda a vida, silenciosamente, até o dia em que nos conscientizamos da origem da nossa falta de vontade, da dificuldade de acessar a intuição e do esgotamento que carregamos.


Essa é a grande ferida que a Antroposofia e a Psicanálise nos ajudam a enxergar: a incompreensão de que a autonomia e a vontade nascem ali, no santuário do controle esfincteriano.



A Agressividade Sutil: A Pressão Disfarçada de Cuidado


O ponto crucial é que a pressão que viola a alma da criança não está apenas no grito. Somos agressivos mesmo quando achamos que estamos respeitando, quando nossa ansiedade se disfarça de cuidado excessivo.

Pense no tormento da pergunta repetida: "Quer fazer xixi? Quer fazer cocô?" Essa não é uma ajuda; é uma tentativa de controle que destrói a confiança da criança no próprio corpo. Ou, ainda, a celebração exagerada quando ela acerta, ensinando-a que o amor e a atenção estão condicionados à sua performance no vaso.


Essas ações, que nascem da nossa própria ansiedade de cumprir o protocolo social, são lidas pela criança como uma invasão. Estamos ensinando que nossa necessidade de controle é mais importante que o sinal interno dela. O corpo dela, em resposta, pode se fechar, negar o processo ou desviar essa energia para a luta (agressividade).

"O cocô, na verdade, não é sujo, é o primeiro presente que a criança traz ao mundo." — A sabedoria de Donald Winnicott ecoa, desnudando a verdade: quando este presente é forçado, ele se torna uma obrigação, e a criança é compelida a lutar.

A Antroposofia, por sua vez, revela a consequência dessa luta: a Energia Vital que deveria estar construindo a saúde e a paz da criança é desviada para a resistência. A criança entra em esgotamento, manifestando o nosso mini-burnout infantil.



O Espelho da Alma: Do Conflito Anal ao Burnout Adulto


A resistência de minha criança me ofereceu um espelho. Onde hoje, na vida adulta, estamos vivendo no Falso Self? Onde a sua Energia Vital está sendo esgotada pela obrigação?


  • O Desrespeito à Intuição: Se eu fui treinada a ignorar meu corpo, como posso hoje ouvir minha intuição para dizer "não" ao trabalho excessivo ou para sentir o momento exato de buscar o repouso? O medo da ansiedade é o eco do medo de "errar".


  • A Tirania do Resultado: Se fomos recompensados apenas pela fralda seca, internalizamos que o Desempenho é o único caminho para sermos amados. Essa lógica perversa nos leva à exaustão, onde trabalhamos até o colapso, pois o resultado é mais importante que o nosso Ser.


A negação da minha filha não era um desafio, mas um grito pela integridade.



A Jornada de Retorno: Resgatando a Vontade


Por aqui resolvemos manter a fralda. No recuar, eu não apenas respeitei o tempo de minha filha; eu reforcei minha própria cura de necessidade de controle. Eu disse a ela: "O controle é seu, meu amor. Eu te amo incondicionalmente, com ou sem fralda, alegre, triste ou brava."


Este é o ato de Autoeducação que nos reconecta à nossa essência.

A vivência de nossas crianças ilumina e resgata nossa própria história. Ao honrar a Vontade de sua criança, você resgata o seu Self Verdadeiro, aquele que sabe a hora de dar, a hora de reter e, acima de tudo, a hora de dizer Sim à sua própria vida, sem o medo de falhar.


A revolução da autonomia não está nas grandes decisões, mas no respeito ao fôlego da alma em cada pequeno ato do cotidiano.



 
 
 

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